quarta-feira, 1 de setembro de 2010

UM SERRANO DE OUTRAS TANTAS TERRAS

Este serrano que já é do mundo tamanha a experiência e capacidade de “anotar” que lhe é própria, edita blog na Internet que vale a pena para conhecê-lo um pouco e trocar impressões e expressões de vida e sabedoria. É dono de uma das melhores galeria de arte de BH, e circula com desenvoltura pelos restritos espaços de conhecimento e arte mundo afora. Acumula em sua trajetória profissional relevantes conquistas, a frente de projetos financeiros como o Grupo Real (no Brasil, Paraguai e África) e o extinto Banco Bemge. Diplomado em Administração e em Ciências Contábeis, foi Co-fundador e Professor da Universidade de Negócios - UNA, Belo Horizonte, e professor do Curso de Vendas do “Sales Analysis Institute”, Chicago, EUA. É ainda Cidadão Honorário de Belo Horizonte, entre outras muitas realizações pessoais e profissionais. Para inaugurar esta coluna, que deve apresentar mensalmente sentimentos, impressões e expressões das gentes de Minas, Feiz Nagib Bahmed, um mineiro libanês de alma serrana.

QUEM SOU
Eu fui campeão de gude de três buracos. Eram três buraquinhos seguidos; você jogava no primeiro, media um palmo, jogava no segundo.... fui campeão. Minha primeira sala de aula foi um imenso fogão de lenha, em minha casa, do qual fiz meu quadro negro. Sem professores, tinha apenas a ajuda de meu pai, que me fornecia o giz. Imitava letras dos cadernos escolares de minhas irmãs - é que o grupo escolar só recebia meninos com sete anos e eu não os havia ainda conquistado. Quando ganhei a idade, ingressei no meio do ano, quase um Ruy Barbosa de fogão. Escrevia tudo, lendo já “de carreirinha”, como dizia Chico Anísio. Após, na saudável ausência de minhas irmãs, assomava ao piano delas e, conhecendo rápido o primeiro acorde, fui em frente, de orelha, até animar bailes domésticos com as saudosas marchinhas de Carnaval.
DONO DO TEMPO
Enquanto se está no trabalho tem-se pouco tempo para pensar. Teoricamente, durante o dia, você está pensando profissionalmente. Para vencer na vida você tem que pensar profissionalmente o dia inteiro. No meu caso, pensava até de madrugada. Quando você se aposenta faz aquelas coisas que tinha vontade de fazer. Eu estou fazendo aquilo que eu sempre tive vontade de fazer.

ANOTAÇÕES
Poucas pessoas anotaram as coisas como eu anotei. Eu trabalhava duro e só me sobrava tempo para duas coisas: arte e leitura, anotações. O que eu fazia e até hoje faço é anotar. Tenho muita coisa que eu anotei, coisas diversas. O que hoje serve para um blog onde posso falar de futebol a filosofia (www.feiznb.com.br).

FUTURO
Estou fazendo um livro sobre os meus discursos. O meu primeiro discurso foi no “Partido Integralista”, do Plínio Salgado, aos sete anos, escrito por uma prima, muito culta. Outro é um dos meus livretos, que se chama “Estátuas que Falam”, feito quando nós inauguramos o busto do João Pinheiro no Serro. Quando o Serro fez 250 anos fui nomeado orador da solenidade em que compareceu Magalhães Pinto, que transferiu daqui (BH) para o Serro a Capital. Isso foi em 1954. Fui orador oficial, dos 50 anos do Banco Real, em São Paulo.Tem o discurso de quando eu recebi o Título de Cidadão Honorário de Belo Horizonte, eu aceitei em nome do Vale do Jequitinhonha, que foi quem construiu Belo Horizonte. O Serro perdeu profissionais de construção, que vieram para aqui, onde tinham um ganho muito maior e muito mais trabalho. O Vale, de certa forma, deu muito para a construção de Belo Horizonte.

MONUMENTO
Assisti ao êxodo de quase todas as famílias de classe média alta e ricas do Serro para Belo Horizonte, ao ponto de que hoje Belo Horizonte tem mais serranos do que o Serro. Uma das razões é alguma coisa de que a gente se orgulha muito, mas é algo que, do ponto de vista econômico, é dramático: o Serro ser tombado. É você não ter a possibilidade de reconstruir uma cidade moderna. Tudo lá é antigo. É muito bonito, mas estou encarando apenas o lado econômico. O Serro é, por tudo, uma doação. Sim, o Serro é a estratificação de um pequeno pedaço da pátria e de um significativo momento de um tempo. Seu tombamento é uma fraternal doação de uns poucos à imensidão de todos os brasileiros que nos sucederem, eternamente.

PERTENCIMENTO
O grande sentimento de afeição e de amor ao Serro nasce em mim de certa forma mais forte do que em outras pessoas que lá nasceram, inclusive, meus próprios filhos, porque o meu pai saiu lá do Oriente e foi recebido no Serro, um estrangeiro, e hoje é nome de uma Rua - o nome de um homem em uma rua não é um nome é uma frase. Uma das coisas é essa. A segunda coisa é que tive uma mãe encantadora que nasceu no Serro. Vivi uma época em que a família era ainda um bloco “fazedor” da cultura geral do país. Porque existia algo que hoje não existe mais: a mesa. Era absolutamente proibido falar qualquer coisa triste, discutir ou censurar à mesa. Só coisas alegres. E acontece que hoje a mesa ficou esvaziada; a reunião diária onde nasciam os valores da família e da pátria.

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