quarta-feira, 16 de novembro de 2011

DEVOÇÃO A NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO

Ari Gonçalves de Almeida sempre percebeu o que estava a sua volta com olhos curiosos e afoitos de quem de tudo quer participar. Muito jovem já se dedicava aos destinos da Juventude Operaria Católica. Ajudou também a definir rumos no Sindicato dos Professores (Sindiute) e no Partido dos Trabalhadores (PT). A Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos é objeto de estudo e dedicação deste filho devoto, que não perde uma manifestação, seja no Serro, onde é Presidente da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, em Belo Horizonte, onde mora,  ou em qualquer outra cidade que seja possível chegar! Esse mineiro de João Pinheiro, cidade do noroeste do Estado, vive em BH desde os 10 anos de idade. Licenciado em filosofia pela UFMG, Ari se aposentou como professor de historia, e ainda deu sua contribuição ao acervo da Imprensa Oficial, com matérias e reportagens ricas em detalhes e pesquisa ampla, publicadas no jornal Minas Gerais. Desta época, Ari Gonçalves conserva uma reportagem que fez, em julho de 1991, sobre o sino “sem torre” da Igreja do Rosário.

Como o Sr. entrou para a Irmandade?
Vim ao Serro pela primeira vez, há uns trintas anos, para participar de um Carnaval. Gostei muito da Festa e me falaram: “Você vai gostar é de uma festa que tem aqui no mês de julho”. Foi meu primeiro contato com a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, e no segundo ano em que participei da Festa, entrei para a Irmandade. Fui festeiro, primeiro Juiz, Rei duas vezes e Mordomo do Mastro. Então fui aprofundando minha relação com a Irmandade e me interessando por tudo o que diz respeito ao Congado e à cultura negra que, já me atraia muito, pela minha própria condição de negro. Até que fui lançado candidato para Presidente. Já estamos no segundo mandato.

Por que a Irmandade do Rosário no Serro?
O que me encanta na Festa do Rosário do Serro é sua característica de profunda fé. Isso me impressiona. Impressiona como Nossa Senhora do Rosário consegue chegar ao coração das pessoas. É também uma festa muito rica em colorido, música, dança. Foge aos padrões tradicionais de uma festa religiosa. Não é uma festa comportada. Eu costumo até dizer que se durante a Festa do Rosário não tiver uma bagunçazinha, não é Festa do Rosário. Uma briga entre congadeiros, confusão na hora de servir almoço na casa de festeiro. É uma festa que foge aos padrões normais de uma festa religiosa, sem deixar de ser uma festa religiosa.  Tem um terceiro aspecto que me liga a Irmandade do Rosário do Serro, que é seu aspecto histórico, conservado a partir da tradição oral. É uma tradição que passa de pai para filho. Este aspecto me interessa também pela minha condição de homem ligado à história. 

O que significa para o Senhor estar como Presidente da Irmandade?
Temos uma responsabilidade muito grande de preservar todo o patrimônio material, espiritual e cultural da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário. Temos que estabelecer frentes diferentes de atenção. Atenção para o patrimônio material que precisa ser preservado, a nossa Igreja, Cemitério, as imagens. Outra preocupação é manter a Irmandade atual, presente no mundo moderno, mas sem perder suas raízes históricas e as suas referencias tradicionais. Por exemplo, chamamos nossa Assembléia Geral de Mesa do Rosário, e era como se falava em 1728. Ainda elegemos os nossos festeiros como os escravos elegiam. Eles não sabiam escrever, ler, fazer uma cédula, assim, eles estabeleceram a votação por meio de grãos. Cada candidato é votado com um grão diferente, que contamos para saber quem foi o vencedor da disputa. O terceiro desafio é estar atento às possibilidades que o mundo da cultura oferece às instituições - quando falo mundo da cultura, refiro-me ao Ministério da Cultura, Secretarias de Cultura. É preciso estar atento ao que estes órgãos podem nos oferecer para realizar as obras e os anseios da Irmandade.

E a Torre Sineira, como foi esta realização?
Quando entrei para a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, vi um sino no chão da Igreja e procurei saber por que ele estava ali. Este sino tem uma longa historia. Ele é de 1810, foi fundido aqui no Serro e pertenceu a uma torre que nossa Igreja teve na lateral esquerda. Esta torre ruiu e toda a Igreja estava em péssimas condições. O presidente da Irmandade, na época, reuniu uma comissão para restaurar a Igreja, mas não havia recursos financeiros. Então venderam o sino para custear as obras. Um dia - é uma historia que quero confirmar - Zé de Fina (José Mourão), que foi irmão do Rosário por muito tempo, descobriu este sino em Belo Horizonte, pelo seu som. Ele passou pelo bairro da Graça, ouviu um sino batendo e disse: “este sino é do Serro. Eu lembro deste sino quando era menino”. Com a descoberta, iniciou-se um movimento para o resgate do sino. O sino retornou para o Serro e então começou uma outra etapa desta historia. Uma discussão entre a Irmandade e o IPHAN sobre como seria construída a torre para o sino. A Irmandade queria a reconstrução da torre original e o IPHAN dizia que não. Passaram-se três, quatro anos até que a Irmandade aceitasse a proposta do IPHAN, mas a Irmandade não teve recursos para construir a torre. Quando assumi a presidência, decidimos fazer um projeto para captar recursos no Fundo Estadual de Cultura, que foi aprovado. Mas tivemos que fazer outro projeto arquitetônico porque o IPHAN não aceitou a planta que a própria instituição havia feito há 30, 40 anos. Depois de muita discussão, inauguramos a nossa torre sineira, em setembro deste ano, em uma cerimônia emocionada.

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