sexta-feira, 11 de abril de 2014

VÃO-SE OS ANÉIS, FICAM OS DEDOS

Das terras serranas, um sem fim de sonhos dourados escoou para enfeitar os desejos de outros povos, de outras gentes. Os veios de sangue da terra jorraram intransigentes ao deleite das dragas inescrupulosas que sem piedade garimparam anseios de riqueza. E muitos se foram... E muitos ficaram... E outros tantos inspiram o mesmo sonho que não brota mais em intensidade ou sequer alimenta o corpo na lida cotidiana. E o Serro viu serem erguidos e abandonados castelos dourados que não são mais do que areia... infértil e sem vida. E a história se perpetua na extração insolente das entranhas da terra, dos leitos dos rios, das matas que outrora foram virgens. E a cidade - que se formou, cresceu, murchou e se reergueu do ouro - encontra mais uma vez o seu destino na proibição do garimpo e na escassez das antes voluptuosas minas auríferas que já não fazem mais caso ao desejo do homem.
Entre tantas idas e vindas, vontades e inspirações esquecidas, passeiam o Serro e seus rincões, alimentando-se do passado e buscando a prosperidade futura, que, certamente, não está no retorno à mineração. E não é diferente no povoado de Boa Vista de Lajes, a 25 km da sede do Município.  Lá o garimpo também trouxe riquezas e abandono. Lá as famílias contemporâneas - assim como as do Serro passado - também experimentaram a opulência e a decadência e viram maridos, pais, seus homens, precisarem sair do pequeno lugarejo para alçar outros vôos e buscar em terras estranhas a sobrevivência que já não vem da natureza, mas do trabalho. As mulheres ficaram. Os filhos, a lida diária, a sobrevivência.
E então as ganas de outros sonhos constroem a esperança. Um grupo de nove mulheres antecipa o futuro e encontra na manufatura artesanal de objetos utilitários e de decoração a possibilidade de antecipar a crença em tempos melhores. A matéria prima escolhida é o capim barba de bode, abundante e típico da região. O apoio para tornar concreta a vontade veio da Associação Clube de Mães, Oscip com sede no distrito de São Gonçalo do Rio das Pedras, e da Associação Comunitária Campos Verdes, de Boa Vista de Lages. A realização da inspiração vem com a criação do Grupo Estrela do Campo, em 2008, formado por mulheres “comprometidas com a promoção de mudanças na comunidade local”, segundo conta ao Ekos de Minas a artesã Elizângela Sales Vieira Cardoso (foto), uma das bravas que doam seu tempo e seu talento para “construir alternativas econômicas sustentáveis, amparadas nos conhecimentos tradicionais e na convivência harmoniosa com o meio ambiente”, argumenta.
O artesanato já reuniu a família de sete das nove artesãs que participam do projeto. Com os maridos em casa, a renda pode ser complementada com o plantio de frutas e hortaliças para subsistência e ainda comercialização para a merenda escolar. O manejo do capim - a inspiração que vem do cerrado - é cuidadosamente estudado com o apoio da UFVJM para não faltar matéria prima.
Assim, o Estrela do Campo ensina a harmonia com o ambiente e reforça a participação da família na construção  dos rumos que pretende o futuro, responsáveis pelas suas escolhas e conscientes da sua atuação no mundo. Pura utopia... O desafio agora, segundo Elizângela, é ensinar aos jovens que o melhor é ficar.


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